AMAZÔNIA: IMAGINÁRIO REAL, REALIDADE IMAGINÁRIA (2)

No texto anterior, demonstrei que o espaço geográfico que hoje é denominado Amazônia passou a ser objeto de desejo e cobiça após navegadores espanhóis e portugueses percorrerem o curso do grande rio que se estende do Peru ao Atlântico, praticamente cortando todo o território situado na porção norte da América do Sul.

 

 

                 Fonte: Imagem obtida em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Amaz%C3%B4nia

 

Vimos que em janeiro de 1500, os exploradores espanhóis, sob o comando de Vicente Yanez Pinzon, chegaram ao delta do Amazonas. Depois, entre 1560 e 1561, foram realizadas novas viagens, comandadas por Pedro de Ursúa e Lopo de Aguirre. Entretanto, mesmo com tantas investidas, os espanhóis não chegaram a ocupar a área. Após as viagens de Orellana, Pedro de Ursúa e Aguirre, a Amazônia passou a ser conhecida na Europa, envolta em relatos fantásticos, superlativos, maravilhados que sugeriam uma espécie de paraíso perdido, um novo mundo, onde seria possível viver em felicidade e paz. Basta lembrar que o cronista de Orellana, Frei Gaspar de Carvajal, deu à sua narrativa o seguinte título: “Relación Del Nuevo Descubrimento Del Famoso Rio Grande de las Amazonas” revelando terem encontrado mulheres amazonas em alguns pontos do grande rio. Tais mulheres, excepcionalmente hábeis no manejo de arcos, seriam brancas e altas, andavam praticamente nuas, mostrando seus belos e musculosos corpos. Ainda segundo o relato, através dos habitantes locais,

[…] souberam que elas dominavam uma grande região e exigiam impostos dos índios. Havia 70 aldeias onde residiam somente mulheres. Suas casas não eram de palha, mas de pedra e com portas. Ficavam em aldeias interligadas por estradas e controladas por soldados. As amazonas não se casavam. Quando desejavam, faziam guerra contra o reino vizinho e capturavam índios com quem viviam o tempo necessário para engravidarem. Esses índios eram altos, brancos e viviam em aldeias populosas. Depois da gravidez, devolviam os machos sem molestá-los e, depois do parto, mantinham somente as meninas. Entre essas mulheres, havia uma hierarquia: as chefes possuíam grande riqueza em ouro e prata, enquanto suas comandadas usavam vasilhas de madeira e tachos de barro. Na capital do império, havia cinco templos dedicados ao culto do sol. No interior das construções, havia estátuas de mulheres feitas de ouro e prata, além de objetos feitos em metais preciosos para servir ao sol. As chefes vestiam-se com roupas de fina lã, mas o tecido cobria o corpo somente do peito para baixo. Os cabelos eram soltos e chegavam até o chão e na cabeça usavam coroas de ouro. Andavam na corcova de camelos ou no lombo de bichos parecidos com cavalo, apesar de terem pêlos compridos e patas fendidas. Esse reino fabuloso atraiu aventureiros em busca de riquezas. (VAINFAS, 2000, p. 34)

Note-se que tais relatos mirabolantes estavam em completo contraste com a forma de vida dos habitantes nativos, mas, por outro lado, enchiam os olhos e aguçavam os desejos de enriquecimento para toda sorte de aventureiros do além-mar.

E não tardou para que o grande rio viesse a ser rota de empreitadas comerciais que, embora tivessem por objetivo maior a procura de ouro e outros metais preciosos, não deixavam escapar a oportunidade de obter ganhos através do comércio com produtos tais como sementes, peixes, tabaco, e outras fontes de riqueza. O lucro obtido com esse comércio favorecia a acumulação de capitais para empresas particulares de diversas nações européias.

Até o início do século XVII, os portugueses ainda não haviam conseguido ocupar definitivamente a região, tornando-a alvo fácil para a passagem de embarcações estrangeiras, especialmente francesas e inglesas, que se aproveitavam para obter os produtos desejados como, por exemplo, o pau-brasil. Em 1612, os franceses, comandados por Daniel de la Touche (Senhor de la Ravardière) e François de Rassily, fundaram a França Equinocial e o Forte de São Luís.

[…] À época, a ilha já estava amplamente povoada pelos Tupinambá que tinham vindo da costa leste movidos pelo sentimento de ficar longe dos portugueses (Abbéville, 1945: 63; Métraux, 1927: 6-10). Marinheiros franceses vinham mantendo proveitosamente, há mais de trinta anos, relações comerciais de troca com os Tupinambá da Ilha e da Serra do Ibiapaba, no Ceará. Pelos troncos de pau-brasil, tatajuba, tabaco e produtos tropicais exóticos que os índios carregavam até suas naus, davam em troca facas, machados, enxadas, tesouras, espelhos, panos, chapéus, contas de vidro e outras bugigangas baratas […] (GOMES, 2002, p. 114).

Portanto, a primeira tentativa organizada de instalação naquele vasto território coube à França, com a fundação da cidade de São Luís do Maranhão, o que significou, na prática, a aglutinação urbana de vários mercadores que já freqüentavam a região desde pelo menos meados do século anterior. Tal iniciativa, porém, forçou a reação de Portugal e acelerou uma série de providências da nação lusa para assegurar a posse efetiva das terras que pleiteavam lhes pertencer por direito, com base no Tratado de Tordesilhas, assinado entre Portugal e Espanha em 7 de junho de 1494, sob a arbitragem do Papa Alexandre VI.

Um ano antes, havia sido proclamada a bula Inter coetera, segundo a qual era traçada uma linha imaginária a partir das ilhas de Cabo Verde, dividindo as terras entre Espanha e Portugal. Mas essa medida, na prática, significava um retrocesso para os privilégios que Portugal havia conquistado nesse campo e por isso o rei D. João II exigiu um novo acordo. Aqueles dois países católicos eram beneficiários do poder de dominação e cristianização dos territórios e povos conquistados em terras de infiéis.

Mas desde a viagem bem-sucedida de Cristóvão Colombo à América em 1492, financiada pela Espanha, esta aumentou seu prestígio perante a Igreja Católica, o que significava maior poder de barganha nas questões de natureza diplomática. Por outro lado, Portugal tratou de buscar maior segurança para suas investidas comerciais através das rotas marítimas.

Assim, o Tratado de Tordesilhas garantiu 370 léguas a partir das ilhas de Cabo Verde e embora nunca tenha sido rigidamente respeitado, garantiu a Portugal o direito de posse sobre a imensa faixa litorânea do Atlântico sul. Caso não tivessem obtido êxito nessa disputa diplomática, as terras descobertas por Cabral pertenceriam, por direito, à Espanha.

A figura apresentada a seguir facilita a visualização da importância que teve para a expansão colonial portuguesa a revogação da bula Inter coetera e a assinatura do Tratado de Tordesilhas. Com a ampliação da área de abrangência, os portugueses ficaram legalmente habilitados para a colonização das terras descobertas por Cabral em 1500.

 

 

   Fonte: COSTA, L. C. A;  MELO, L. I. A. História do Brasil. São Paulo: Scipione, 1999, p.28

 

A linha demarcatória de Tordesilhas, contudo, não garantia a ausência de investidas de outros povos em busca de obtenção de riquezas e, inclusive, a posse de terras do Novo Mundo.

Entre 1580 e 1640, Portugal e Espanha formam a União Ibérica, junção das Coroas de Portugal e Espanha. Filipe II da Espanha passou a ser Filipe I de Portugal (1580-1598), ficando a União Ibérica sob o domínio da dinastia dos Habsburgos (na seqüência, subiram ao trono Filipe III da Espanha, II de Portugal: 1598-1621; e Filipe IV da Espanha, III de Portugal: 1621-1640). Apesar da união das Coroas em um mesmo soberano, não houve anexação do país. Juridicamente, Portugal continuou a ser um reino independente, regido por suas leis e detentor de seus domínios no ultramar. Essa união, acontecida por razões de sucessão, criou condições favoráveis para a expansão territorial portuguesa, especialmente para a empreitada na Amazônia.

 
 

Referências

COSTA, L. C. A; MELO, L. I. A. História do Brasil. São Paulo: Scipione, 1999.

GOMES, Mércio Pereira. O índio na história: o povo Tenetehara em busca da liberdade. Petrópolis: Vozes, 2002.

KIDDER, Daniel P. Reminiscências de viagens e permanências no Brasil (províncias do norte). Tradução Moacir N. Vasconcelos. São Paulo: Martins/Editora da Universidade de São Paulo, 1972.

VAINFAS, Ronaldo. (Org.). Dicionário do Brasil colonial. (1500-1808). Rio de Janeiro: Editora Objetiva, 2000.

 

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